Piracicaba

Leia a íntegra da representação entregue ao MP pelo deputado Paulo Fiorilo

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROMOTOR DE JUSTIÇA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO  PAULO ROBERTO FIORILO, brasileiro, casado, Deputado Estadual, portador do RG nº 10.271.497-6 SSP/SP e CPF …

ícone relógio05/09/2025 às 15:24:25- atualizado em  
Leia a íntegra da representação entregue ao MP pelo deputado Paulo Fiorilo

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROMOTOR DE JUSTIÇA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

 PAULO ROBERTO FIORILO, brasileiro, casado, Deputado Estadual, portador do RG nº 10.271.497-6 SSP/SP e CPF nº 032.641.518-12, com gabinete funcional na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, Palácio 9 de Julho, Av. Pedro Álvares Cabral, 201, Gabinete T-04, Moema, CEP 04097-900, vem, com fundamento no art. 127 e art. 37, § 4.º, da Constituição da Federal, no art. 25, I, da Lei Complementar Estadual nº 734/1993 e nos arts. 9.º, arts. 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021, apresentar a presente REPRESENTAÇÃO PARA APURAÇÃO DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de TARCÍSIO DE FREITAS, Governador do Estado de São Paulo, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:

I Dos Fatos

 

 Nas últimas semanas, o governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tem direcionado seus esforços não ao cumprimento das atribuições institucionais próprias do cargo, mas à articulação política em favor de um projeto de anistia destinado a beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023, com finalidade político-eleitoral declarada de ampliar sua projeção nacional.

Conforme amplamente noticiado pela imprensa, Tarcísio cancelou agendas em São Paulo e deslocou-se a Brasília no último dia 2 de setembro de 2025, mobilizando o aparato do Estado para pressionar a pauta da anistia, enquanto mantinha como justificativa oficial apenas uma reunião com o diretor-geral da ANEEL, Sandoval Feitosa, às 15h de terça-feira, 2 de setembro de 2025.

Durante dois dias, portanto até o dia 3 de setembro de 2025, o governador permaneceu em Brasília com agenda oficial praticamente inexistente, realizando encontros reservados com lideranças políticas para viabilizar a anistia [1]

Na quarta-feira, 3 de setembro de 2025, data em que o Supremo Tribunal Federal julgava o núcleo central da organização criminosa golpista, o governador permaneceu em Brasília sem qualquer compromisso oficial pelo governo de São Paulo, como atestava o próprio portal institucional do governo do estado de São Paulo.

Esse conjunto de condutas ocorre justamente em um momento em que o Estado de São Paulo enfrenta sérios problemas de gestão, a exemplo do escândalo que atinge a Secretaria da Fazenda (SEFAZ), marcado por fortes indícios de corrupção. Em vez de enfrentar as graves questões que comprometem diretamente a administração estadual, o Governador optou por se ausentar de seu cargo e deslocar-se a Brasília para articular a anistia de aliados políticos e projetar sua candidatura presidencial, abandonando as responsabilidades imediatas inerentes ao exercício do governo paulista.

Tal postura revela, de forma inequívoca, o desvio de finalidade no uso da máquina pública e o desprezo pelas atribuições constitucionais que lhe foram conferidas!

De volta a São Paulo, longe de retomar os assuntos de interesse imediato da população, o governador manteve ainda no próprio dia 3 de setembro de 2025, a agenda voltada à articulação política, nas dependências do Palácio dos Bandeirantes, dando prosseguimento a uma conduta que, em essência, subordina a máquina pública paulista a fins particulares, viola a probidade administrativa e busca interferir indevidamente na jurisdição do Supremo Tribunal Federal [2]

Diante desse quadro, resta claro que o governador do Estado de São Paulo, ao utilizar recursos e estrutura pública para fins pessoais e eleitorais, desviou-se das atribuições constitucionais do cargo e colocou o aparelho estatal a serviço de interesses privados e partidários.

 

II Do Direito

 

 1. Do desvio de finalidade, impessoalidade e moralidade

 

Os fatos narrados evidenciam que o Governador do Estado desviou a finalidade institucional de seu cargo, utilizando a estrutura pública em benefício de interesse pessoal e político-partidário. Em vez de atender ao interesse público do povo paulista, o Chefe do Executivo dedicou esforços na articulação da anistia destinada a beneficiar seu aliado, o ex-Presidente da República Jair Messias Bolsonaro, e ao mesmo tempo em que buscava projetar sua própria candidatura presidencial.

O artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988 estabelece que a administração pública

“obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”

 No mesmo sentido, a Constituição do Estado de São Paulo reforça essas diretrizes e explicita, em seu art. 111, que a administração estadual deve observar também os princípios da finalidade, motivação, interesse público e razoabilidade.

Artigo 111 A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência”

O referido artigo reforça que qualquer utilização da máquina administrativa que personalize a atuação estatal em prol de determinada autoridade ou grupo configura, em si mesma, promoção pessoal ilícita, violadora dos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade e desvio de finalidade.

No presente caso, o Governador cancelou agendas oficiais e deslocou-se a Brasília sob pretexto de uma reunião técnica na Aneel para, na verdade, engajar-se em campanha por anistia a envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro, pauta alheia às atribuições institucionais do Governo [3]de São Paulo.

Nesse sentido, conforme enfatiza o Supremo Tribunal Federal, o agente público não pode utilizar o cargo que ocupa ou os recursos públicos que administra para autopromoção política, sob pena de incorrer em desvio de finalidade e contrariar os princípios da impessoalidade e da probidade.

Portanto, ao subordinar a máquina pública paulista a interesses particulares e eleitorais, o Governador afrontou os deveres de motivação, interesse público e finalidade inerentes à função pública. Os princípios constitucionais, em conjunto com a Lei de Improbidade Administrativa, a Lei nº 8.429/1992, com redação da Lei nº 14.230/2021, tipifica a postura do governador como um ato de improbidade, caracterizado por aquele que atenta contra os princípios da Administração Pública (art. 11) quando praticado dolosamente.

No presente caso, o dolo é manifesto, pois o Chefe do Executivo deliberadamente desviou suas atribuições com a finalidade de beneficiar um aliado político e aumentar sua projeção pessoal, o que atende ao requisito de intenção ilícita previsto na lei.

Em síntese, ao abandonar a impessoalidade e instrumentalizar o cargo para fins privados, o Governador praticou conduta incompatível com a probidade administrativa e a moralidade pública, incorrendo, em tese, em ato ímprobo por violação aos princípios constitucionais (art. 11 da LIA).

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas:

(…)

IV – negar publicidade aos atos oficiais, exceto em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado ou de outras hipóteses instituídas em lei”

Feitas essas considerações, resta claro que o Governador do Estado de São Paulo, ao desviar a finalidade do cargo e utilizar a estrutura administrativa em favor de interesses privados e eleitorais, violou de forma dolosa e consciente os princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade, incorrendo em ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021.

 

2.  Prejuízo ao erário (despesas públicas para finalidade alheia ao interesse público)

 

Além de violar princípios, a conduta descrita acarretou dispêndio indevido de recursos públicos, configurando potencial lesão ao erário.
Durante os dias em que se ausentou de São Paulo para tratar da anistia em Brasília, o Governador fez uso de meios custeados pelo Estado, como aeronave, veículo oficial, combustível, diárias de deslocamento, horas de trabalho de seguranças e assessores, tudo isso sem qualquer proveito público concreto para a população paulista.

Tais gastos, realizados fora das finalidades institucionais do cargo, caracterizam desvio de recursos públicos e podem ser enquadrados como ato de improbidade administrativa que causa dano ao erário, nos termos do art. 10 da LIA. Após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, considera-se ato lesivo ao erário “qualquer ação ou omissão dolosa que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades públicas”.

À luz do art. 10 da Lei nº 8.429/1992, com a redação conferida pela Lei nº 14.230/2021, verifica-se que a conduta do Governador enquadra-se, em tese, em diversos de seus incisos, ao utilizar, em serviço particular, veículos, equipamentos e pessoal de segurança pertencentes ao Estado, em claro e inequívoco desvio de finalidade.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é clara nesse sentido. No AgRg no REsp 1.242.744/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 28/06/2013, restou assentado que “o uso de veículo oficial para fins particulares configura ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário, nos termos do art. 10 da Lei nº 8.429/1992”.

Em suma, há fortes indícios de que o erário paulista arcou com despesas alheias ao interesse público, configurando, em tese, ato de improbidade por lesão ao erário, nos termos dos incisos I, XII e XIII do art. 10 da Lei nº 8.429/1992, com redação da Lei nº 14.230/2021.

 

3.  Obstrução da Justiça (interferência indevida no livre exercício do Poder Judiciário)

 

As condutas do Governador também representam uma tentativa indevida de interferência no exercício independente do Poder Judiciário, o que fere gravemente o princípio da separação de Poderes e pode ser qualificado, do ponto de vista jurídico, como obstrução da justiça.

Ao empenhar-se em conseguir uma anistia ampla para os envolvidos nos atos antidemocráticos, justamente durante o julgamento desses indivíduos pelo Supremo Tribunal Federal, o chefe do Executivo paulista agiu para esvaziar e invalidar as consequências do processo judicial em curso.

Trata-se de intervenção política visando impedir que o Poder Judiciário cumpra livremente seu dever de julgar e punir crimes contra a ordem constitucional. O governador chegou a dizer que “não confia na Justiça” [4]

Nesse sentido, a Constituição Federal, em seu artigo 85, estabelece que constituem crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República e, por simetria, dos Governadores de Estado, que atentem contra a própria ordem constitucional.

 

No caso em análise, são especialmente pertinentes os seguintes incisos:

“Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;

VII – o cumprimento das leis e das decisões judiciais.”

 

Por simetria, um Governador de Estado que utilize de seu cargo para obstar ou esvaziar decisões judiciais incorre em falta igualmente grave, violando os deveres de respeito às leis e às instituições.

Em conclusão, verifica-se que o Governador do Estado de São Paulo, ao desviar recursos e ações governamentais para beneficiar interesses privados, e ao buscar interferir no andamento e eficácia de processos judiciais, incorreu em graves violações jurídico-constitucionais.

Suas condutas apontam para desvio de finalidade do ato administrativo, lesão ao erário e potencial ato de improbidade administrativa, além de configurarem afronta aos princípios da separação de Poderes e da legalidade.

Diante de todo o exposto, encontram-se presentes os fundamentos jurídicos para que o Ministério Público do Estado de São Paulo apure rigorosamente os fatos narrados e tome as medidas cabíveis, a fim de restaurar a legalidade e a moralidade na gestão pública paulista.

 

III Dos Pedidos

 

Diante do exposto e considerando a gravidade e a relevância institucional dos fatos narrados, requer-se a Vossa Excelência:

a) a instauração, no âmbito deste Ministério Público, de procedimento investigatório, com fundamento no art. 129, III, da Constituição Federal, visando a apuração integral das condutas descritas, inclusive quanto a ocorrência de atos de improbidade administrativa;

b) A responsabilização do Governador representado, caso comprovados os fatos, pela prática de ato de improbidade administrativa, nos termos dos arts. 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021, com a consequente aplicação das sanções legais cabíveis;

c) A condenação do representado ao ressarcimento integral dos danos causados ao erário paulista, nos termos do art. 37, 4º, da Constituição Federal, com devolução dos valores indevidamente despendidos em viagens, diárias, transportes e demais recursos públicos utilizados para fins particulares e político-eleitorais;

d) A comunicação ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), para auditoria contábil e financeira dos gastos públicos envolvidos, conforme art. 35, §2º, da Constituição Estadual;

e) A adoção de medidas cautelares, se cabíveis, para resguardar provas e evitar novas práticas lesivas, inclusive mediante requisição imediata de documentação de viagens e despesas correspondentes.

Termos em que, Pede deferimento.

São Paulo, 05 de setembro de 2025.

Paulo Fiorilo Deputado Estadual

 

 [1] https://revistaforum.com.br/politica/2025/9/4/tarcisio-cancela-agenda-em-sp-usa-dinheiro-publico-para-comandar-anistia -bolsonaro-em-brasilia-186934.html

[2] https://www.sp.gov.br/sp/institucional/agenda_governador

[3] https://noticias.uol.com.br/colunas/josias-de-souza/2025/09/02/desesperado-bolsonaro-recorre-a-tarcisio-e-lira-por-anisti a-geral.htm#:~:text=Nesta%20ter%C3%A7a,anistia

[4] https://oglobo.globo.com/opiniao/editorial/coluna/2025/09/anistia-e-afronta-irresponsavel-a-constituicao.ghtml

 

 

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